segunda-feira, 26 de setembro de 2011
TERCEIRIZAÇÃO: STF reconhece a ausência de responsabilidade da administração pública
Rcl 12558 - RECLAMAÇÃO
Origem:
DF - DISTRITO FEDERAL
Relator:
MIN. CÁRMEN LÚCIA
RECLTE.(S)
ESTADO DE SÃO PAULO
PROC.(A/S)(ES)
PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
RECLDO.(A/S)
TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO
ADV.(A/S)
ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
INTDO.(A/S)
CRISTINA APARECIDA DA SILVA
ADV.(A/S)
ADILSON GUERCHE
DJE nº 181, divulgado em 20/09/2011
DECISÃO
RECLAMAÇÃO. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO. ALEGAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DA DECISÃO PROFERIDA NA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE N. 16 E DESRESPEITO À SÚMULA VINCULANTE N. 10 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
Relatório
1. Reclamação ajuizada pelo Estado de São Paulo, em 12.9.2011, contra decisão proferida pela 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que, nos autos do Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n. AIRR-130940-64.2007.5.02.0022, teria afastado a aplicabilidade do art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666/1993 e descumprido o que decidido na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16 e desrespeitado a Súmula Vinculante n. 10 do Supremo Tribunal Federal.
2. A decisão impugnada tem o teor seguinte:
“RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA – SÚMULA N. 331, V, DESTA CORTE. Demonstrado que o Estado contratou, sem as cautelas devidas, empresa para lhe prestar serviços, e, ainda, não cuidou de fiscalizar o cumprimento dos encargos trabalhistas, por parte de sua contratada, evidenciada fica sua responsabilidade pelo pagamento dos créditos dos empregados, por caracterizar a culpa in eligendo e in vigilando, respectivamente, a teor da Súmula 331, V, desta Corte. Precedente do Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Constitucionalidade nº 16. Agravo de instrumento não provido.” (fl. 1, doc. 7).
3. O Reclamante alega que, “ao confirmar a decisão de segundo grau – afastando a incidência do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/83, sem declarar expressamente a inconstitucionalidade do dispositivo –, o acórdão objeto da presente reclamação infringiu a Súmula Vinculante nº 10, ao mesmo tempo em que afrontou a autoridade da decisão proferida na ADC 16” (fl. 5).
Argumenta que “a despeito de reconhecer formalmente a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93 – e, isto, ao que tudo indica, para não afrontar abertamente a autoridade da decisão proferida pelo STF no julgamento da ADC 16 –, o TST continua ‘desaplicando’ o citado dispositivo legal” (fl. 6).
Sustenta ser “cabível, portanto, a presente reclamação, tanto para a garantia da autoridade da decisão proferida pelo STF na ADC nº 16-DF, como por contrariedade à Súmula Vinculante nº 10” (fl. 12).
Pede seja cassada “a decisão judicial impugnada, determinando que outra seja proferida com aplicação da Súmula Vinculante nº 10 e da orientação assentada no julgamento da ADC nº 16-DF” (fl. 12).
Examinados os elementos havidos nos autos, DECIDO.
4. Razão jurídica assiste ao Reclamante.
5. O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal dispõe, no art. 157, que “o Relator requisitará informações da autoridade, a quem for imputada a prática do ato impugnado” e, no art. 52, que “poderá o Relator dispensar a vista ao Procurador-Geral (...) quando sobre a matéria versada no processo já houver o Plenário firmado jurisprudência”.
A presente reclamação está instruída com todos os documentos essenciais para a solução da controvérsia e a 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, fundamentou sua decisão na Súmula n. 331 daquele Tribunal especializado, matéria recorrente neste Supremo Tribunal, razão pela qual deixo de requisitar informações à autoridade Reclamada e dispenso o parecer do Procurador-Geral da República.
6. O que se põe em foco na presente reclamação é se a 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho teria descumprido a decisão do Supremo Tribunal Federal proferida na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16, ao aplicar o entendimento da Súmula n. 331 daquele Tribunal para reconhecer a responsabilidade subsidiária da Administração Pública pelo cumprimento de obrigações trabalhistas.
7. Na sessão plenária de 24.11.2010, o Supremo Tribunal Federal julgou procedente a Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16 para declarar a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666/1993:
“RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. Subsidiária. Contrato com a administração pública. Inadimplência negocial do outro contraente. Transferência consequente e automática dos seus encargos trabalhistas, fiscais e comerciais, resultantes da execução do contrato, à administração. Impossibilidade jurídica. Consequência proibida pelo art. 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666/93. Constitucionalidade reconhecida dessa norma. Ação direta de constitucionalidade julgada, nesse sentido, procedente. Voto vencido. É constitucional a norma inscrita no art. 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995” (ADC 16, Rel. Min. Cezar Peluso, Plenário, DJe 9.9.2011).
O acórdão do julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16 foi publicado em 9.9.2011. No entanto, este Supremo Tribunal assentou ser desnecessária a publicação do acórdão tido por afrontado para o cabimento de reclamação, pois a decisão proferida em ação objetiva de controle de constitucionalidade tem efeito vinculante e eficácia erga omnes desde a publicação da ata do julgamento.
Nesse sentido:
“AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO. PROCESSAMENTO DA RECLAMAÇÃO CONDICIONADO À JUNTADA DA ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO DITO VIOLADO. PUBLICAÇÃO DA ATA DE JULGAMENTO DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE NO DIÁRIO DE JUSTIÇA. REFORMA DO ATO QUE NEGOU SEGUIMENTO À RECLAMAÇÃO. 1. O cabimento da reclamação não está condicionado a publicação do acórdão supostamente inobservado. 2. A decisão de inconstitucionalidade produz efeito vinculante e eficácia erga omnes desde a publicação da ata de julgamento e não da publicação do acórdão. 3. A ata de julgamento publicada impõe autoridade aos pronunciamentos oriundos desta Corte. 4. Agravo regimental provido” (Rcl 3.632-AgR, Redator para o acórdão o Ministro Eros Grau, Plenário, DJ 18.8.2006, grifos nossos).
8. Na espécie vertente, a decisão impugnada foi proferida em 3.8.2011 (fl. 5, doc. 7); a ata do julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16, publicada em 3.12.2010. Portanto, ao afastar a aplicação do § 1º do art. 71 da Lei n. 8.666/1993, com base na Súmula n. 331 do Tribunal Superior do Trabalho, a 4ª Turma do Tribunal especializado descumpriu a decisão do Supremo Tribunal Federal proferida na Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 16.
Nesse sentido:
“Responsabilidade Subsidiária da Administração Pública. Afastamento. Art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993. Constitucionalidade. Precedente. ADC 16. 4. Agravo regimental a que se dá provimento, para reconsiderar a decisão agravada e julgar procedente a reclamação” (Rcl 9.894-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário, DJe 17.2.2011).
Confira-se excerto do voto do Relator:
“Ao apreciar a ADC 16, Rel. Min. Cezar Peluso, Sessão Plenária de 24.11.2010, esta Corte julgou procedente a Ação Declaratória de Constitucionalidade para declarar a compatibilidade do referido dispositivo com a Constituição. Ante o exposto, dou provimento ao agravo regimental, para reconsiderar a decisão agravada, e, com com base na jurisprudência desta Corte (art. 161, parágrafo único, RISTF), conheço da reclamação e julgo-a procedente, para cassar o acórdão reclamado e determinar que outro seja proferido em seu lugar, levando em consideração a decisão deste Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993, proferida na ADC 16”.
Em caso análogo ao dos autos:
“ As disposições insertas no art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993 e no inciso IV da Súmula TST 331 são diametralmente opostas. 5. O art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993 prevê que a inadimplência do contratado não transfere aos entes públicos a responsabilidade pelo pagamento de encargos trabalhistas, fiscais e comerciais, enquanto o inciso IV da Súmula TST 331 dispõe que o inadimplemento das obrigações trabalhistas pelo contratado implica a responsabilidade subsidiária da Administração Pública, se tomadora dos serviços. 6. O acórdão impugnado, ao aplicar ao presente caso a interpretação consagrada pelo Tribunal Superior do Trabalho no item IV do Enunciado 331, esvaziou a força normativa do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993. 7. Ocorrência de negativa implícita de vigência ao art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993, sem que o Plenário do Tribunal Superior do Trabalho tivesse declarado formalmente a sua inconstitucionalidade” (Rcl 8.150-AgR, Redatora para o acórdão a Ministra Ellen Gracie, Plenário, DJe 3.3.2011, grifos nossos).
9. No julgamento da Questão de Ordem no Agravo Regimental na Reclamação n. 9.894, Relator o Ministro Gilmar Mendes, este Supremo Tribunal assentou que os Ministros poderiam julgar monocraticamente os processos relativos à matéria, na esteira dos precedentes.
10. Pelo exposto, na linha do entendimento firmado por este Supremo Tribunal, julgo procedente a presente reclamação para cassar a decisão proferida pela 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho proferida nos autos do Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n. AIRR-130940-64.2007.5.02.0022, e determinar que outra decisão seja proferida como de direito.
Publique-se.
Brasília, 15 de setembro de 2011.
Ministra CÁRMEN LÚCIA
Relatora
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